Processo é mais que provocação e impulso oficial

Não canso de dizer e tentar ensinar: um processo judicial vai muito além de uma boa petição inicial ou de uma grande defesa. Isto é, precisamos olhá-lo em um todo.

E quando digo “olhá-lo em um todo”, é fazer uma criteriosa análise de tudo aquilo que orbita ao redor do caso concreto.

A partir disto, daí sim, traçar sua estratégia ideal. Ou seja, depois de realizar um estudo sobre os riscos, estará apto a iniciar sua partição no processo judicial.

Mas, você pode vir aqui e dizer: processo é processo.

Está bem! De todo errado não estará. Afinal, os processos judiciais nada mais são do que uma sequência de atos, onde as partes provocam impulsos oficiais (decisões, despachos, etc).

Mas, se por um lado, esse raciocínio é correto; de outro, quando pensado, apenas, no movimento seguinte, verá que suas possibilidades de mudança de curso vão se tornando muito reduzidas.

Nos casos em que atuo, não são raras as vezes em que, para que eu chegue ao resultado objetivado, será necessário muito mais que um único procedimento. Isto acontece, exatamente, por conseguir pensar o caso que me foi confiado de uma maneira macro e não micro.

Reparem! Quando recebem seus clientes para defendê-los em determinadas causas, haverá SEMPRE um detalhe específico, que difere o caso de tantos outros, aparentemente, iguais.

É a sua capacidade de percepção, ou melhor dizendo, de identificação destas especificidades, aplicando-as ao caso, que lhe possibilitará ser diferente.

Fazendo uma metáfora, imagine que o processo judicial em que está atuando sejá um jogo de xadrez.

Pela regra desse jogo, a partida sempre se inicia com o movimento das peças brancas, vindo, a seguir, o lance do jogador que está ao lado das peças pretas.

Desse modo, inicialmente, é indiscutível que as brancas [em tese] estão um movimento à frente. Ou estou errado?

Nesse sentido, se os jogadores permanecerem [rigorosamente] em atuação convencional do jogo, isto é, só pensando no movimento seguinte do seu adversário, a partida acabará com xeque-mate das brancas sobre as pretas. Verdade absoluta.

Essa lógica só pode ser alterada de duas maneiras, quais sejam: um erro do jogador que está movimentando as peças de cor branca ou, ainda, algo diferente, inesperado, realizado pelo adversário que move as pretas. Isto é, o segundo sai da lógica.

É exatamente assim que posiciono minha advocacia e minhas atuações em processos judiciais. Eu arrisco sair da lógica, daquilo que é o corriqueiro, aguardado.

Conceituei esse instante de reversão da lógica. Que nada mais é do que tirar os atores processuais (parte contrária, advogados adversos, juízes e, quando é o caso, promotores de justiça) da zona de conforto.

Na prática, como primeiro efeito, para que tenham uma ideia sobre o quanto falo, no exato instante em que procedo à protocolização da petição que materializa a reversão da lógica, imponho uma obrigatoriedade, sob pena de estarem se arriscando à vergonha, de trabalho mais atento e acautelado do meu colega adverso e dos Magistrados dos feitos. Em outras palavras, a manifestação (peticionamento) será LIDA por aquele a quem ela é destinada.

Assim, ainda que filtrada pelas assessorias, sou convicto da leitura pelos Juizes da causa. É patente o que falo.

É por esta razão que proíbo em meu meu escritório a utilização de modelos. Nem mesmo aqueles por nós criados. Afinal, cada caso é um caso.

Outro fenômeno interessante é você passar a ter o controle do processo, por mais que a condução [por força da lei] não lhe pertença.

Acredite! Quando você “sair da casinha”, saberá EXATAMENTE o que acontecerá.

Isto quer dizer que tudo aquilo que requerer lhe será dado?

Óbvio que não! Mas, igualmente evidente, que estará pronto para dar seu movimento seguinte. As rédeas estão com você.

Mais um detalhe de enorme relevância à aplicação da reversão da lógica é sair da mesmice de inserir no corpo de suas petições “n” artigos da lei, outras trocentas jurisprudências e incontáveis citações de doutrinas aplicáveis ao seu caso. Isto não quer dizer que deva abdicar de fazê-lo. Faça, contudo, de maneira muito pontual, quando e se necessário.

Em relação às duas primeiras, o julgador conhece o texto legal e as jurisprudências adequadas. Já, em relação à terceira (doutrina), ele tende a seguir uma determinada corrente.

Nessa lógica, o relevante é você apresentar de maneira clara as razões pelas quais ele deva entregar ao seu cliente, mediante uma decisão, aquilo que apresenta em detrimento dos pedidos no sentido contrário. Ou seja, o que faz do seu caso diferente de tantos outros, semelhantes ou idênticos, que passam pela análise dele todo “Santo Dia”, é conseguir fazer com que, ao ler seu peticionamento, o Juízo se veja levado a pensar, examinar seu caso em relação aos demais, para, somente então, decidir.

Quando deixa de proceder desse modo, mantém o Juízo em sua zona de conforto, para deliberar de maneira mecânica, sem fazê-lo pensar muito. Entende?

Aqui, portanto, o que pretendo transmitir a vocês é uma ideia de que a mesmice induz à traquilidade do julgador. E este, diante de um escrito meu [seu], precisa ficar inquieto.

Assim, de forma bem clara: quando seu peticionamento chegar “Concluso”, além da assessoria (primeiro filtro) saber que a lógica já está invertida, importante que o Juízo, ainda que não exteriorize esse sentimento, pense: “Taquepariu! Qual será a bomba para eu desarmar desta vez?”.

Nem preciso dizer, imagino, que para tudo isto ocorrer, você, da mesma forma, não estará em uma zona de conforto. Somente estará no comando do processo, ao longo do percurso.

Em outras palavras, SIM, você irá deitar para dormir pensando no processo sob seu patrocínio, não tenha dúvidas! E se for diferente, corra do contencioso. Mas, quem tem que perder a noite de sono é o lado contrário, não você! Isso virou rotina do meu dia-a-dia, refletida nos primeiros telefonemas que recebo no dia seguinte.

Ganhei causas. Igualmente, perdi. É do “jogo”.

Em nenhuma, porém, não obriguei a todos darem o máximo de si. Isto é o mínimo que um advogado contratado DEVE fazer por seus clientes.